quinta-feira, 29 de julho de 2010

Ceremony

Fazia muito tempo que nem aparecia por aqui. Falta de tempo. Nem falei sobre o show do A-ha; corre grande risco de eu me esquecer dos detalhes. Mas hoje não é para isso. Não mesmo. Vim porque estou inquieta. Nos últimos dias do único mês de férias do internato, sem querer, passeando pela internet, nem lembro como, cheguei em Ceremony. Primeiro na versão do New Order. Não consegui escutá-la por inteiro.

Primeiro vou explicar aos que não fazem nem idéia do que é New Order e Joy Division. Joy Division era uma banda de pós-punk inglesa do final dos anos 70 cujo vocalista e letrista, Ian Curtis, sofria de graves problemas de epilepsia não controlada, depressão, abuso de álcool, desadaptação e problemas conjugais. Tinha crises de epilepsia durante os shows e, inclusive, fez uma música sobre sua doença: "She´s lost control". Há 30 anos (18/05/1980), em meio ao sucesso da banda - que estava prestes a iniciar uma turnê nos EUA - e o tormento de sua conturbada vida pessoal, Ian se enforca em sua própria casa. Bom, pouco tempo depois, os membros restantes (Bernard Sumner, Peter Hook e Stephen Morris) e a namorada de Stephen formaram uma nova banda: New Order. O Joy Division era bem mais pesado, era muito reflexo da decadência e as sobras que o capitalismo deixou para juventude da classe trabalhadora de cidades operárias da Inglaterra; além de sofrer grande influência dos problemas de Ian. Já o New Order vem com uma sonoridade diferente, mais influências da música eletrônica, buscando uma superação.

Agora voltando ao início do ponto. Ceremony foi uma das últimas músicas escritas e cantadas por Ian antes de sua morte. No primeiro disco do New Order, regravaram Ceremony, uma homenagem ao que eles construíram e ao companheiro que havia partido. O fato é que a versão, apesar de menos sombria, evoca uma forte melancolia. Faz-nos sentir presos ao passado, sem saber se é possível superá-lo. Um medo.
Certa vez, tive um pesadelo e me acordei com uma sensação que realmente não explicar. Uma dor física; aperto no peito, dispnéia, algo de angústia com medo, raiva, culpa e rancor. Realmente não sei descrever. Parei e tentei me lembrar do sonho. Veio a mim como um filme triste: uma pessoa de que gosto muito havia cometido suicídio. Tudo muito rápido, ainda consigo me lembrar e reviver- em menor intensidade, claro- o que vivi e senti naquela noite: Raiva, nem uma carta de despedidas, por que não me conversou comigo sobre o assunto?; Culpa, porque não pude ajudar, Impotência, por não ter podido evitar; Corroída. Conversei sobre o assunto, os maus dias foram passando, me esqueci.
Acontece que, meses depois, ao reescutar Ceremony, tudo o que senti voltou. Como se a cabeça não parasse de girar, parece que os sentimentos são uma bomba, quase a me explodir. Minha pele, meus ossos são uma frágil parede de uma barragem de sentimentos transbordantes, com toda a pressão para vazar. Fechar os olhos, respirar, tudo dói.

Acredito que, da primeira vez, cheguei perto, mesmo que por instantes da sensação que o enlutado de um suicida tem. Daí fica pra mim mais fácil entender por que é que esse tipo de luto tem mais chances de virar patológico. Porque é uma dor paradoxalmente inexorável, porque é austera, firme, quando se tenta superar; ao passo que cresce, logo quando se mantém, cresce em degraus. É isso, cresce em degraus.

Sei que não foi apenas a música que me trouxe de volta esse sentir. É interessante, que justamente nesses últimos dias, tenho pensado no Sísifos e o poema que eu havia escrito antes pensando em algo, agora ganha outra simbologia; mais dura e sombria. Por isso a música me remeteu ao pesadelo. Não porque Ceremony é uma música triste, mas porque eu fugi, tentei me esconder da pedra que descia tão rápido, por esse caminho tão íngrime. Enquanto me escondia, Sísifos tentava, em vão, gritar, do topo da colina, que não adiantava me esconder, a maldição está ali; por mais que a pedra esteja no alto, e ele já com as pernas cansadas e sangrantes, braços trêmulos e fatigados, não interessa, a PEDRA CAI. Resta a Sísifos o sonho de um dia sair dessa condição. Ceremony me lembrou disso.

Por que ele simplesmente não chuta a pedra montanha a baixo, para que ela se despedace de vez? Não sei, as prisões da mente não são tão simples de se conseguir alavará, ou seria alforria?

O Ian também gostava do Bowie, e ao que a cronologia me permite inferir, ele também deve ter ouvido Heroes/Helden. Não acreditou, Tânatos venceu seu Sísifos.
P.S. Desculpe-me por tudo, mas não desistiremos de você.

Um comentário:

Anônimo disse...

que texto!!
hehehe, acho que só respirei qdo terminei de ler :)

nossa.
clap-clap!

gostei muito da idáia de empurrar a pedra montanha abaixo com força suficiente para arrebentá-la!
q tal?